4 de setembro de 2018 – A Organização Pan-Americana da Saúde/Organização Mundial da Saúde (OPAS/OMS) reafirmou nesta segunda-feira (3) seu compromisso em trabalhar junto aos países da região das Américas para eliminar doenças transmissíveis até 2030. Um novo marco de ação foi apresentado no 54º Congresso da Sociedade Brasileira de Medicina Tropical (Medtrop), em Olinda (PE), por Jarbas Barbosa, subdiretor do organismo internacional.
“Estamos trabalhando em consonância com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) para ter gerações futuras livres de doenças transmissíveis nas Américas. Para isso, precisamos conseguir o acesso universal a medidas de detecção dessas enfermidades e tratamento precoce”, afirmou Barbosa. O subdiretor da OPAS disse ainda que há um esforço para incluir doenças e condições não transmissíveis em um marco diferente, tratando não só a transmissão e as mortes, mas também as morbidades e sequelas.
O novo marco é constituído por quatro linhas de atuação, que envolvem serviços de saúde integrados; geração, análise e disseminação de estratégias robustas; abordagem dos determinantes ambientais e sociais; e a integração com a atenção primária à saúde. “Está sendo feito um mapeamento de todas as doenças e as dimensões de cada uma delas, que terá um conjunto de indicadores construídos com uma abordagem multissetorial”. Segundo Barbosa, as consultas com os países devem ter lugar ao fim de 2018, seguindo para aprovação no Conselho Diretivo da OPAS no próximo ano.
Barbosa também traçou um panorama da atual situação das doenças transmissíveis nas Américas, entre elas o sarampo. “Neste ano, a Venezuela completou mais de 12 meses de transmissão sustentada de sarampo e, com isso, perdeu o certificado de eliminação da doença. Os outros países da região continuam com sua certificação individual, mas existem riscos. O Brasil vem fazendo campanhas de vacinação junto com estados e municípios, mas se não interromper a transmissão da doença até fevereiro de 2019, também pode perder seu certificado”, complementou.
Um outro desafio do Brasil, segundo Barbosa, é conseguir pensar em formas eficazes de quebrar as barreiras de acesso às vacinas para a população, adaptando os sistemas de saúde às suas necessidades. “Mães e pais que trabalham não conseguem levar seus filhos para se vacinar durante o horário comercial, em dias de semana. A vacina está no posto de saúde, mas as pessoas não conseguem chegar a ela.”
Vírus zika e os desafios impostos à saúde pública
A primeira conferência do Congresso deste ano abordou o vírus zika e sua resposta no âmbito do Brasil. Enrique Vásquez, coordenador de Doenças Transmissíveis e Análise de Situação de Saúde da OPAS/OMS, trouxe à memória o MedTrop de 2015, em Fortaleza, onde o tema já havia sido discutido. “Nenhum de nós ali sabia o que iria suceder poucos meses depois. Essa é uma oportunidade para saber como foi a construção do conhecimento sobre a doença e suas consequências."
A conferencista do evento, Maria de Fátima Pessoa Militão de Albuquerque, integrante do Grupo de Pesquisa da Epidemia da Microcefalia (MERG) desde 2015, apresentou uma linha do tempo da epidemia, que teve lugar primeiramente no Brasil, espalhando-se depois para mais de 40 países. Ela lembrou que o aumento do número de neonatos com microcefalia começou a ser percebido em agosto de 2015, em Pernambuco, por duas neuropedriatras. A partir desse acontecimento, a evolução da epidemia se deu rapidamente. “Desde a percepção de que havia um agregado de dados de qualidade até a declaração de estado de emergência de saúde pública nacional, pelo Ministério da Saúde, e da reunião convocada para a criação do MERG, passaram-se apenas três meses”.
A síndrome congênita do vírus zika foi incluída na Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde (CID 11), lançada pela OMS em junho deste ano.
Já na mesa redonda “Global vector control response/2017-2030: é possível alcançar?”, Ana Carolina Faria e Silva, dos Centros de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) no Brasil, e Renato Vieira, coordenador geral de Doenças Transmissíveis do Ministério da Saúde, falaram sobre a ferramenta da OMS para o controle de vetores. Vásquez, que coordenou a atividade, afirmou que o documento, adotado na Assembleia Mundial da Saúde em maio de 2017, tem como principal objetivo apontar intervenções “para reduzir a carga das doenças causadas por vetores que afetam seres humanos”.
Ana Carolina revelou que 80% da população mundial está suscetível a contrair doenças causadas por vetores. “O documento chama os países a reverem suas estratégias de controle vetorial e seus planos operacionais de ação”, disse. Entre essas enfermidades estão a malária, dengue, zika, chikungunya, Chagas e oncocercose. Ela citou os quatro pilares do marco da resposta, sendo eles: reforçar as ações e a colaboração intersetorial e intrasetorial; conseguir participação e mobilização das comunidades; melhorar a vigilância de vetores e o monitoramento e a avaliação das intervenções; e ampliar e integrar ferramentas e enfoques.
Para Vieira, a publicação do documento da OMS foi oportuna para o país fortalecer suas capacidades de lidar com emergências. Falou ainda sobre alguns dos desafios para o controle de vetores no Brasil, citando o caso da febre amarela. Em dois anos, o Brasil teve mais de 2 mil casos de febre amarela – mais do que foi registrado em 36 anos, de 1980 a 2016 –, disse o coordenador. Ele afirma que um dos avanços no tema foi a criação do Comitê Técnico Assessor do Ministério da Saúde para Vetores, do qual a OPAS/OMS participa. “Essa iniciativa tenta trazer, do ponto de vista científico e técnico, um suporte à tomada de decisão do Ministério da Saúde e a integração não só dos programas, mas entre o setor saúde, sociedades científicas e poder público para nos trazer propostas de respostas práticas”.