25 de maio de 2018 – Aos 65 anos, Heliana Hemetério tem muitas histórias para contar. Mulher negra e lésbica, iniciou sua vida na militância social em 1986, quando se engajou politicamente com o movimento negro. No entanto, ela percebeu que uma pauta importante não estava sendo abordada naquele espaço: o gênero. Neste momento, transitou para o movimento de mulheres negras e, em seguida, para o movimento feminista. Foi no início da década de 1990 que a militante começou a frequentar espaços e participar das discussões relacionadas à população LGBTI.
Esta entrevista feita pela Organização Pan-Americana da Saúde/Organização Mundial da Saúde (OPAS/OMS) com Heliana Hemetério faz parte da ação digital “Destaque-Laranja”, uma iniciativa que diversas agências do Sistema ONU no Brasil farão, ao longo do ano, em reconhecimento a pessoas, cidades, escolas, universidades, empresas e outras instituições com atuação relevante para a prevenção e eliminação da violência contra as mulheres e meninas no país. A ação acontecerá todo Dia Laranja – que ocorre no dia 25 de cada mês – como parte da campanha “UNA-SE pelo fim da violência contra as mulheres”.
Hoje, a historiadora Heliana Hemetério, que também é especialista em gênero e raça, compõe a vice-presidência da Associação Brasileira de Gays, Lésbicas, Bissexuais, Travestis e Transexuais (ABGLT) e é titular no Conselho Nacional de Saúde (CNS), representando o segmento LGBTI. Sua principal bandeira é a da articulação entre movimentos sociais para fortalecer o enfrentamento ao racismo e à LGBTIfobia. “Não abrimos mão daquilo que a gente acredita, que é a defesa de nossos direitos. Precisamos ampliar totalmente a nossa discussão, fazendo uma interlocução entre todos os outros movimentos.”
A Associação vice-presidida por Heliana ultrapassa as fronteiras geográficas do Brasil e atua também em países da América Latina e do Caribe. Em 2017, ela participou do Encontro Feminista Latino Americano e do Caribe (EFLAC). O próximo destino será a Colômbia, onde Heliana e outras pessoas representarão a ABGLT no Encontro da Mulher Negra Latina e Caribenha. A historiadora conta que, em breve, vai dar o pontapé inicial para um projeto de formação de novas lideranças. “Essa juventude, que assume esses desafios, está ‘pipocando’. Por isso, é necessário fazer uma formação para que entendam a história do movimento de lésbicas negras, o porquê de ele existir.”
A discriminação cria uma carga pesada à população de lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transexuais e intersexuais. Uma das maiores preocupações de Heliana diz respeito à saúde mental das vítimas de preconceito. “O nível de depressão entre gays e lésbicas e, principalmente entre travestis e transexuais, muitas vezes leva ao uso abusivo do álcool e de outras drogas”. Sua entidade recentemente criou uma secretaria em sua estrutura para discutir e enfrentar o tema.
A OPAS/OMS também tem reunido especialistas nacionais e internacionais para debater essa questão. No ano passado, por exemplo, a psicóloga e ativista Lyah Côrrea afirmou, em evento realizado no escritório da OPAS/OMS no Brasil, que o suicídio entre pessoas trans muitas vezes é uma forma de cessar o sofrimento do processo de negação existencial do ponto de vista do outro. “As depressões podem refletir os impactos e dinâmicas sobre o estigma social que as identidades trans causam. Falar sobre isso é visibilizar um grupo populacional que histórica e culturalmente não existia. Ou existia, mas na ordem patológica, da marginalidade, da criminalidade. Infelizmente, é assim que as trangeneridades são debatidas”, afirmou na época.
Heliana também cita o acesso universal à saúde como uma forte pauta para LGBTIs. “Os profissionais de saúde muitas vezes não estão preparados e a discriminação é estruturante. Às vezes é um atendimento totalmente indigno, negligenciado”.
Ela lembra que o Brasil já possui políticas públicas de saúde para a população LGBT, negra, em situação de rua e do campo, entre outras, e que o preconceito é um obstáculo para que elas sejam colocadas em prática. “É preciso que a sociedade olhe para dentro de si, perceba seus próprios preconceitos e privilégios e tente trabalhar isso.”
Saúde universal
Ter saúde universal significa que todas as pessoas, sobretudo as que estão em situação de vulnerabilidade – não importa onde estejam –, tenham acesso a cuidados de saúde efetivos e de qualidade e sejam protegidas de dificuldades financeiras no momento em que necessitam de assistência.
Abrange toda a gama de serviços de saúde, desde promoção até prevenção, tratamento, reabilitação e cuidados paliativos. Além disso, o alcance da saúde universal envolve ações de diversos setores da sociedade, para enfrentar a pobreza, injustiça social, déficit de educação e habitação insalubre, entre outros fatores que influenciam o estado de saúde das pessoas.
Saúde universal foi o tema deste ano do Dia Mundial da Saúde (7 de abril).
Dia laranja
No dia 25 de cada mês, a equipe da OPAS/OMS Brasil se veste de laranja para marcar sua adesão à iniciativa global “Torne o Mundo Laranja”, da campanha Una-se Pelo Fim da Violência Contra as Mulheres.
Esse tipo de violência abrange tanto as desigualdades de gênero enfrentadas por mulheres, quanto práticas discriminatórias e nocivas geradas pelo preconceito por orientação sexual e identidade de gênero. A cor laranja, brilhante e otimista, foi escolhida para representar um futuro livre de agressões contra mulheres e meninas.
Conheça outro Destaque-Laranja:Joanna Maranhão inaugura ação digital ‘Destaque-Laranja’ em campanha da ONU Brasil pelo fim da violência contra as mulheres e meninas.