27 de abril de 2018 — Brasil, Cuba e a Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS) apresentaram nesta quinta-feira (26) um panorama sobre os resultados do Programa Mais Médicos. O painel, que ocorreu durante a Convención Internacional Cuba Salud 2018, em Havana, capital da ilha caribenha, mostrou como a iniciativa tem desde a sua criação se baseado nos princípios da saúde universal, fortalecido a cooperação internacional no hemisfério sul e ajudado a reduzir a desigualdade.
Joaquín Molina, representante da Organização Pan-Americana da Saúde/Organização Mundial da Saúde (OPAS/OMS) no Brasil destacou o efeito que o Programa teve no Sistema Único de Saúde brasileiro. “A desigualdade diminuiu de uma maneira notável entre os municípios mais ricos e mais pobres do país. O Mais Médicos hoje segue e se fortalece, contribuindo para a equidade em saúde de uma maneira importante”.
Denilson Campello, diretor do Departamento de Planejamento e Regulação da Provisão de Profissionais de Saúde do Ministério da Saúde do Brasil, lembrou que o programa Mais Médicos foi criado pelo governo brasileiro anterior e que, por conta de sua alta qualidade, se manteve na nova gestão, sempre com a participação de diversos atores. “Dentro do trabalho e da governança do Mais Médicos, existem duas situações muito parecidas de discussões tripartite. Temos a cooperação, que é o trabalho feito com Cuba e OPAS para fazermos ajustes e buscarmos novas ideias, a fim de melhorar o serviço do programa para o usuário final. E temos a tripartite no Brasil, com CONASS (Conselho Nacional de Secretários de Saúde) e CONASEMS (Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde), onde sentamos, discutimos e aprovamos todas as ideias e ajustes necessários ao programa”.
Durante o evento, Yiliam Jiménez, diretora geral da Comercializadora de Servicios Médicos Cubanos S.A. do Ministério da Saúde Pública de Cuba, destacou as diferenças entre seu país e o Brasil em termos econômicos, de tamanho da população e quantidade de médicos (enquanto o Brasil tem 1,8 médico por 1.000 habitantes, Cuba tem 7,5). “Mas cremos que tanto o governo brasileiro quanto o cubano seguiram desde o início o princípio de Alma-Ata, de saúde para todos, de equidade em saúde, de cobertura universal. E ambos os países tiveram a oportunidade de contar com a OPAS, o que permitiu uma cooperação trilateral para beneficiar a população brasileira e cubana, dando um exemplo do resultado que dois países do hemisfério sul podem alcançar”.
Na ocasião, a OPAS também apresentou uma série de publicações sobre Mais Médicos. Uma delas destaca o panorama da publicação científica a respeito do programa. Outra analisa a implementação do Mais Médicos no contexto do sistema de saúde brasileiro, a partir de seis estudos de caso, destacando as especificidades que caracterizam a experiência brasileira no cenário internacional. Uma terceira avaliou a qualidade dos serviços de Atenção Primária à Saúde no país e em que medida o programa contribui para isso. A última aborda a cooperação sul-sul entre Brasil e Cuba, com triangulação da OPAS, na área de saúde, produção e transferência de conhecimentos e práticas inovadoras.
Sobre o programa
O Mais Médicos foi criado em 2013 pelo Governo Federal brasileiro, tendo como um dos objetivos suprir a carência desses profissionais nos municípios do interior e nas periferias das grandes cidades. A Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS) coopera tecnicamente com a iniciativa, triangulando acordos entre Brasil e Cuba para a vinda de médicos de Cuba para atuar em Unidades Básicas de Saúde, no setor de Atenção Básica do Sistema Único de Saúde brasileiro.
Três eixos compõem o Mais Médicos: o primeiro prevê a melhoria da infraestrutura nos serviços de saúde. O segundo se refere ao provimento emergencial de médicos, tanto brasileiros (formados dentro ou fora do país) quanto estrangeiros (intercambistas individuais ou mobilizados por meio dos acordos com a OPAS). O terceiro eixo é direcionado à ampliação de vagas nos cursos de medicina e nas residências médicas, com mudança nos currículos de formação para melhorar a qualidade da atenção à saúde.
Resultados
-No primeiro ano do Mais Médicos a cobertura de atenção básica de saúde aumentou de 10,8% para 24,6%. Em relação à toda a Estratégia de Saúde da Família (incluindo Mais Médicos), a cobertura populacional cresceu de 62,7% para 70,4% no mesmo período. Além disso, uma pesquisa feita pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) em parceria com o Instituto de Pesquisas Sociais, Políticas e Econômicas (Ipespe) – com aproximadamente 14 mil entrevistas – apresentou avaliações positivas da população sobre o desempenho dos profissionais brasileiros e estrangeiros que integram a iniciativa. Do total de entrevistados, 81% possuem baixa renda e 95% afirmaram estar satisfeitos com o programa. De 0 a 10, deram nota 8,4. Entre os indígenas, a média foi de 8,7.
-Em dois anos (janeiro de 2013 – janeiro de 2015), o número de consultas médicas na Estratégia de Saúde da Família aumentou 33% nos municípios que participaram do Programa Mais Médicos. Já naqueles que não estavam no programa, o aumento foi de menos da metade: 15%. Fonte: Rede Observatório do Programa Mais Médicos.
-Antes da implementação do programa Mais Médicos, as taxas de internação por condições sensíveis à atenção primária já́ vinham diminuindo no Brasil (em 7,9% de 2009 a 2012). No entanto, essa redução foi mais importante após o programa (9,1% entre 2012 e 2015). A diminuição foi maior nas regiões Norte (21%) e Centro-Oeste (19%) e nos municípios que possuem entre 100 e 200 mil habitantes (18,2%) e entre 30 a 100 mil habitantes (15,8%). As condições sensíveis à atenção primária são problemas de saúde atendidos e resolvidos tipicamente no primeiro âmbito do sistema de saúde. Quando não atendidos a tempo ou adequadamente, evoluem até que o paciente precise ser hospitalizado. Fonte: estudo “O Programa Mais Médicos e internações evitáveis pela Atenção Primária”.
-O estudo “More doctors for deprived populations in Brazil” mostrou que em mais de mil municípios que aderiram ao Mais Médicos houve um aumento na cobertura de atenção básica de 77,9% para 86,3%, entre 2012 e 2015, e uma queda nas internações por condições sensíveis à atenção ambulatorial (que são internações evitáveis), de 44,9% para 41,2% no mesmo período. Essa pesquisa foi feita por autores de várias instituições brasileiras e publicado em um boletim da Organização Mundial da Saúde.
-Após o primeiro ano de implantação do programa Mais Médicos, constatou-se o provimento de 294 médicos para cobrir todas os 34 DSEIs (100%). Segundo dados da Secretaria de Saúde Indígena do Ministério da Saúde do Brasil (SESAI), 339 médicos foram incorporados aos DSEIs ao longo de dois anos do programa, significando um crescimento de 79% em relação ao quantitativo desses profissionais em agosto de 2013. Fonte: estudo “Programa Mais Médicos: desvelando os desafios futuros para a implantação de um sistema de saúde equânime e integral para os povos indígenas”.
-Em 2015, mais de 70% dos municípios brasileiros tinham aderido ao Programa Mais Médicos. Além da expansão, houve substituição das equipes, sugerindo que o Mais Médicos contribuiu para fixação de profissionais e redução da rotatividade, bem como para inserção do médico nas equipes incompletas ou irregulares. Essa situação foi verificada em 53,7% das equipes da Estratégia de Saúde da Família no Brasil e possibilitou, além da cobertura de mais de 20 milhões de pessoas no sistema, “a regularidade dos vínculos trabalhistas e a garantia do cumprimento da carga horária de trabalho, o que incidiu sobremaneira na transformação do processo de trabalho e na melhoria do cuidado na atenção primária no SUS”. Fonte: estudo “Programa Mais Médicos e criação de vínculos com a comunidade e fortalecimento da equipe de saúde”.
Experiência bem-sucedida
A publicação “Good Practices in South-South and Triangular Cooperation for Sustainable Development”, primeira de uma série desenvolvida pelo Escritório das Nações Unidas para a Cooperação Sul-Sul e pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), apresentou o Programa Mais Médicos como uma das boas práticas relevantes para a implementação dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS).
De acordo com a publicação, o programa “é replicável e seria potencialmente benéfico em qualquer país que decidisse adotá-lo”. A avaliação é que o Brasil fez investimentos substanciais para a realização do projeto e que os benefícios de longo prazo “provam superar esses investimentos”.